Coluna 06 - O "Capitão Aldo"
Publicada dia 14 de Setembro de 2003

O "Capitão Aldo"

Ninguém mais se lembra do "Capitão Aldo". Não foi delegado de polícia, chefe de volante no tempo de lampião e muito menos comandante do glorioso "TG-44", orgulho do povo de São Bento nos idos de trinta.

O "Capitão Aldo" era um dobrado, usado como prefixo musical, para caracterizar as aberturas e encerramentos das programações diárias da nossa "emissora", isto é, do Serviço de Alto Falantes de São Bento do Una, de saudosíssima memória, criado por Adauto Paiva, dirigentemente dirigido por ele e uma ruma de voluntários associados do União.

Instalados nos locais mais importantes da cidade, onde quer que houvesse um parapeito disponível, lá estavam os auto-falantes do "S.A.S", com as bocarras dirigidas aos ouvidos da população são bentense, transmitindo notícias, música, poesia, humorismo... e otimismo.

O "Capitão Aldo", na verdade, não era lá um primor de peça musical. Sua indigência harmônica era notória e o questionamento de sua escolha para "prefixo musical" realmente existia. Os músicos da Santa Cecília, por exemplo, habituados a "peças de harmonia" e dobrados belíssimos - Ouvi, Lira de Ouro! -, jamais apreciaram o "Capitão Aldo".

A emissora entrava no ar ao anoitecer, ou extraordinarimente a qualquel hora do dia ou da noite, sempre que houvesse necessidade. O encerramento da programação era feito solenemente, através de poemas, mensagens de boa noite às senhoras e senhoritas sonhadoras da cidade. Milton Paiva e Malaquias Abrantes esmeravam-se na recitações...

O S.A.S provocou uma verdadeira revolução cultural em nossa cidade. De excelente nível, considerando a época e a escassez disponibilidade do lugar, a programação não se limitava à transmissão de juras de amor musicadas, registros de aniversário ou mensagens codificadas de romances secretos, como habitualmente transmitiam as emissoras da região. Gente entendida, embora autodidata, produziam programas cultos e analfabetos. Todos recebiam eqüitativamente as suas, como diríamos hoje, "cestas básicas" de cultura.

Maria de Lourdes Lemos e Ivete Moraes produziam programas dirigidos à mulher sãobentense; Gilvan Lemos, Roberto Valença, Zé e Rui Paiva apresentavam programas humorísticos de grande aceitação; Nô Paiva, Abdon Pereira, Lica Valença, Marcelino, Pedro Tenório, Pedro Jacaré, Zé Iogo e outros não lembrados no momento, eram os responsáveis pela "Hora da Saudade" musical dedicado ao público idoso de São Bento. As lágrimas emocionadas provocadas pelas músicas de Catulo e Vicente Celestino (Porta Aberta, Luar do Sertão), embaciavam as lentes dos velhinhos de São Bento...

As manhãs de Domingo eram reservadas aos novos talentos. A cada semana novos valores surgiam. Tirante alguns poucos desafinados, o saldo era bastante positivo. Dava muito bem para o gasto, para o consumo local...

A utilidade pública do "S.A.S" era de fato, uma realidade. Notas de interesse públicos eram transmitidas, repito, democraticamente, a todo o povo sãobentense, inclusive eventualmente, fora dos horários normais da estação. Até mesmo nos períodos de escuridão compulsória a que sempre estivemos submetidos, o "S.A.S" fazia-se presente, graças ao seu sistema elétrico alternativo: o motorzinho de luz modestamente instalado no fundo do quintal do "União".

Nós, que constituímos hoje, a saudosa velha guarda de São Bento, não temos como pagar o que recebemos do "S.A.S".


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